Educador ensina, e enquanto ensina aprende.
Educador ensina a pensar, e enquanto ensina sistematiza e apropria-se do seu pensar. Pensar é o eixo da aprendizagem.
Aprender pensar envolve lidar constantemente com certo grau de ansiedade. Pois sem ansiedade não se aprende,mas com muita também não. Deste processo, faz parte da aprendizagem aprender a lidar com a própria ansiedade e a dos outros.
Desafio do educador é diagnosticar e dosar o nível de ansiedade que o educando é capaz de lidar no seu processo de aprendizagem. Para isso, antes de tudo, o educador necessita estar consciente de sua própria ansiedade (desejos e expectativas) em relação ao processo de aprendizagem de seus educandos, suas intervenções, devoluções e encaminhamentos terão como objetivo provocar, manter ou amenizar a ansiedade existente, favorecendo o aprender. Aprender a pensar é também um aprendizado de construir opções. Pois equivale a abandonar o antigo referencial quebrando estereótipos,comportamentos cristalizados e perder a segurança do que antes parecia estabelecido e inquestionável, na busca da construção do novo, ainda não sabido. Novo que vem sempre revestido pelo medo, pelo perigoso e persecutório desconhecido.
Para pensar e aprender tem-se que admitir e aceitar em certos momentos, que se está “perdido”. Ver-se numa avalanche de dúvidas, hipóteses e ignorâncias. Pensar envolve construir hipóteses inadequadas “erradas” e ter que refazer,ou inventar outro percurso em busca da adequada “certa”.
Para pensar e aprender tem-se que perguntar. E para perguntar é necessário existir espaço de liberdade e abertura para o prazer e sofrimento inerentes a todo processo de construção do conhecimento.
A pergunta é um dos sintomas do saber. Só pergunta quem sabe e quer aprender. Ninguém pergunta no vazio. Pergunta porque constata que, do que sabe, algo não sabe e só a pergunta desvelará o caminho possível de ser seguido.
O que não se sabe, quem sabe é o outro. O outro que, de um outro lugar, aponta retrata e alimenta o que nos falta. Toda pergunta revela o nível da hipótese em que se encontra o pensamento e a construção do novo conhecimento. Revela também a intensidade da chama do desejo, da curiosidade de vida.
Para perguntar, pesquisar, conhecer, é necessário aprender a conviver com:
- a curiosidade;
- o deparar-se com o inusitado;
- a capacidade de assombrar-se;
- o enfrentar-se com o caos criador;
- a ansiedade e o medo no encontro com o novo.
Para tanto, temos que educar a flexibilidade e a imaginação, para trabalhar a organização e o planejamento, que são ingredientes básicos da disciplina sem a qual não se constrói conhecimento.
Não existiria conhecimento sem a pergunta. A pergunta não teria sentido se não houvesse o conhecimento a ser conquistado, produzido.
Ansiedades, confusões e insegurança são constitutivas do processo de pensar e aprender. Assim como também o imaginar, o fantasiar e o sonhar. Não existe pensamento criador sem estes ingredientes.
Educador ensina a pensar. Mas somente pensar não basta. Educador ensina a pensar e a agir, segundo o que se pensa, enquanto se faz.
O sujeito é uma totalidade de ação e pensamento. Afetividade e cognição. Prática e teoria. Por tudo isso, pensar não é fácil, nem inofensivo. Em muitas situações subverte a ordem, tira o sono, quebra o estabelecido. Dá e provoca muito medo. Medo da desorganização de idéias, do emaranhamento do velho com o novo, da procura aparentemente, desordenada da nova forma. Medo do caos criador.
Mas não existe processo de autonomia (libertação) sem criação e apropriação do pensamento, dos desejos e dos sonhos de vida. É através da reflexão ( no desenvolvimento de suas hipóteses) que o educando se apropria do seu pensamento, no contato com o pensamento dos outros – iguais e teóricos.
Para pensar, conhecer um objeto é necessário recriá-lo, reinvetá-lo. Nesse processo ocorrem mudanças não somente no objeto mas também no sujeito que atua.
O processo de aprendizagem é constituído por esses movimentos de mudanças. Aprender significa mudar, transformar.
Ensinar significa acompanhar e instrumentalizar com intervenções, devoluções e encaminhamentos, esse processo de mudança, de apropriação do pensamento, dos desejos e sonhos de vida. Educador ensina, enquanto ensina aprende a pensar (melhor), e a construir seus sonhos de vida.
FREIRE,Madalena; DAVINI,Juliana;CAMARGO, Fátima;MARTINS, Mirian Celeste. Série Seminários: Avaliação e Planejamento. A prática educativa em questão. SP: Espaços Pedagógicos 1996.
Republicou isso em Aline Nunes Möller.